quinta-feira, 19 de novembro de 2020

sábado, 29 de agosto de 2020

CANTADA



Plagiando Ferreira Gullar
Você é tão linda
Como aqueles bibelôs
Que antigamente se colocavam
Nas janelas.
Você é tão linda
Como o mar de Gaibu ou Pontas de Pedras.
Você é tão linda
Como acordar de madrugada
E ver o sol nascer
Igual a uma gema de ovo
Frita na manteiga.
Você é tão linda
Como a infância ou o mar ou o azul ou
Um poema do Ferreira Gullar.

Você é quase tão linda
Quanto a Revolução bolivariana.

domingo, 9 de agosto de 2020

TODOS OS DIAS


Plagiando Lêdo Ivo

Viver é relativo
Uns comem caviar
Outros são bandidos.

O inferno é aqui
O paraíso ninguém viu.

Apenas o corpo
E uma insistente dor no estômago
Que é a falta de armas e revoluções.

terça-feira, 4 de agosto de 2020

O SÉTIMO LIVRO



Mares, encouraçados, corpos,
Peixes, histórias de mar alto e infinitudes.

Durante sete dias o terá em suas mãos
Sete são as cores do arco-íris

Sete são as voltas e as idas
E assim o ciclo será completado e repetido
Mesmo abrindo as portas dos infernos.

Qual casas que se multiplicam em filhos
Cabeças de hidra que cantam pelo pão.
Uivos!

Escolha bem os Livro e o Sétimo se multiplicarão
Eternamente em cada letra, palavras, parágrafo,
Afagos e falos nervosos sem direção.

O demônio será seu guardião
Não o enganarás mais do que sete vezes sete
O aprisionas e terás vinhos em abundância
E deliciosas dores de cabeça.

quinta-feira, 30 de julho de 2020

O SEXTO LIVRO



Finalmente encontrará a saída
Mas não as voltas, os desígnios proféticos.

Soma todos os seus triângulos
E terás a perfeita forma do Livro sexto.

A justiça só é escrita sem o medo
Mas são tantos os pecados já prescritos

Aberto ao meio se dividira em dois
E perecerá ao encontro do Livro Três
Minhas línguas se transformam em mãos

Portanto, leitor, comande os exércitos
E os uno ao vinho e ao amor.
Reflito não um espelho, mas desejos atônitos.

quinta-feira, 23 de julho de 2020

O QUINTO LIVRO


Havia homens, mulheres, páginas
Tinta e entrelaçar de pernas e dedos.

Olha a sua mão e os seus cinco dedos
no centro encontra-se o Livro

O nome de Fátima é bendito
E todos os cinco sentidos
Têm medo de encontrá-lo em pesadelos.

Em suas páginas a Perfeição perseguida
pelos Deuses e alcançada por Hórus
Apenas ele e suas muralhas em volta de seu corpo.

Após cinco dias nasce o milho
E o olho esquerdo passa a guiar seus passos.
Nunca deves voltar ao ponto que era escuridão.

quinta-feira, 16 de julho de 2020

O QUARTO LIVRO



És todo fígado
Dores, gorduras, cancro.

Havia um homem que cultivava barbas
e de suas barbas surgiam livros
de suas mãos intenções que formavam estrelas
e estas se apagavam ao vento assim o círio.

Quanto mais brancas as barbas
Mais de suas estantes nasciam livros do Livro.
Nasciam asas, mas também ilusões que não eram azuis.

Somas dois quadrados pois és o fazendeiro
E de tuas minas escavaras o ouro e a tanzanita.

Darás de comer a quem o Livro folhear
E a espada para enfrentar os Quatros Cavaleiros.

quinta-feira, 9 de julho de 2020

O TERCEIRO LIVRO



Escaldante é o calor das entranhas
Não queiras conhecer-te por inteiro.

Assim como gozas dentro da mulher amada
Gozarás com as folhas do Livro.

Qual espada dentro do inimigo
Empunharás o Livro contra a morte.

A morte é todo um único esquecimento
Só o Livro resgatará as memórias de uma nação.

Usarás as palavras do Livro
Como as asas usam os pássaros.

quinta-feira, 2 de julho de 2020

O SEGUNDO LIVRO



O álcool em colunas romanas
Impede o avanço inimigo
Dos bárbaros: suicídio e depressão.

Herdas dos teus pais e do teu povo
Tuas fortunas, doenças e guerras.
As lembranças estão no olhar,
Não na memória que se faz tempo.

Herdas do Livro outros livros
Que o primeiro a ser lido é o que vicia.

Bebes teus vinhos, amas tuas crias,
Assim também avanças através do Livro.
Oh Perdedor! Oh Perdedor!

Guerreiro, saberás de tuas derrotas
Nas páginas do Livro, nunca de tuas vitórias.

quinta-feira, 25 de junho de 2020

O PRIMEIRO LIVRO



Choras, lava tua alma
Inspira, respira, alimenta tuas dores.

No princípio Deus criou os céus e a terra
E o primeiro Livro.

E o Livro não se fez carne
para não apodrecer, mas, verbos
e mármores que antecedem escuros.

Tratas com carinho suas páginas
Que as promessas futuras se farão presentes.
Sombras se mostrarão nos caminhos.

És viajante, portanto estrangeiro,
Não te fia nos homens, mas no Livro
na pele, no tato, nas reminiscências.


quinta-feira, 18 de junho de 2020

RECEITA PARA UMA VIDA DIGNA

Uma pitada, bem caprichada, de sorte.
Não passar fome na infância.
Ter a possibilidade de estudar.
Poder trabalhar.
Descobrir os poderes mágicos dos livros.
Esbarar nos amigos que estão espalhados por aí a nossa procura.
Encontrar quem te bote no bom caminho do álcool.
Descobrir o sexo que é o alimento do prazer.
Ter olhares e sorrisos para as ruas, para o povo.
Descobrir que a desigualdade e a injustiça andam juntas de mãos dadas.
Identificar os inimigos que pode ser a própria justiça.
Torna-se poeta ou qualquer outro tipo de artista,
inclusive aqueles que admiram e se emocionam.
Entender que a luta também pode ser armada.
Esperar o momento certo da luta, sem medo algum da morte,
que pode não acontecer no curto espaço da nossa vida,
e, por isso, plantar e regar sempre a semente da revolução.

quinta-feira, 11 de junho de 2020


Dá-me um pouco da tua fé
Uma metade de teu grão de mostarda.
Coloca esta metade em minha mão
E a transforma em espada.

Armado sou um comandante conquistador
E tu minha amada
(ou minha escrava).
Espada em riste mato meu prazer
E o teu prazer será minha grande conquista.

Em nome dos teus deuses
Minha espada os destruirá
E à violência da fé. 

quinta-feira, 4 de junho de 2020

PARA QUE POEMA?

Afinal,
para que serve o poema?
Não sacia a sede
nem mata a fome.
Não serve de moeda de troca
ou de arma para a guerrilha.
Para que serve a vida
ou o beijo na namorada de infância?
O poema, nu,
em folha branca, é prazeroso
E despe-se para os olhos
de quem o procura.
Rasga o véu dos sonhos
e sedimenta-se em palavras.

quinta-feira, 28 de maio de 2020

POEMA PARA LUIZA

A primeira, e única vez que vi Luiza,
Deslumbrei-me!

O que primeiro me chamou à atenção
Foi o sorriso largo e sincero.

O corpo magro, quase adolescente,
Seios fartos... Linda! Lindos!

Morrerei sem nunca mais rever
Luiza?

Como amei essa mulher.

Um homem velho, quarenta anos,
Indefeso ante uma menina com metade da sua idade.

Desde o primeiro momento que te conheci
Te desejei, mas não um desejo efêmero
Mas, si, um efêmero desejo.

quinta-feira, 21 de maio de 2020

NUA ENTRE VASOS DE PLANTAS

                    Stock


Nua entre vasos de plantas
Só de calcinha e sutiã
Perdida na sala de meu apartamento.
As janelas abertas
Prováveis voyeur nos olhando.
Do sétimo andar
Nos filmando
Nos jogando no youtube.
Plantas verdes, jarros marrons
Roupas íntimas brancas.
Minha ex-namorada não gosta de vermelho,
prefere preto.
Na sua calcinha bordou sábado
Quantos sábados serão ainda necessários?
E a namorada que não chega?
E a namorada que não existe?
Olho para as plantas em seus jarros
Você toda de branco
Só.
Um dia ela comeu uvas no meu umbigo
No outro sumiu numa nuvem que ria.
Dia deste misturei azul com vermelho
E deitei no sofá.
Abro-me
Numa cortina:
Começo o espetáculo.
Por que amar se o amor só leva a dor?
Apenas a dor nos acompanha
Em todos os momentos da vida
Comigo a natureza foi mais cruel ainda:
Sou todo dor.

quinta-feira, 14 de maio de 2020

SINAIS


Olha o povo andando
Feito gado,
Gado humano.

Em cada cara o horror,
Em cada rosto a ausência,
Não sabem se esperam o maná
Sinal divino,
Ou se vão lutando pelo pão
Sinal humano.

Não sabem que a vida é fazer-se
Tal a semente que se torna fruto
Tal a madeira que se torna clava,
É fazer-se,
O mundano e o divino,
O pão e o espírito,
A oração e o grito,
A morte e a sobrevivência.

Musicada por Cláudio Almeida
Gravada em 2002
CD "Maracatu pra ela"
https://www.youtube.com/watch?v=Cg6i1oShMtc

quinta-feira, 7 de maio de 2020

CIGARRA


Quando o canto sai inútil
Algo está errado com o cantor
Com a essência do canto
Ou dos ouvidos
Ou das mentes para quem se canta.

Como gestos inúteis
De quem se afoga no mar
Canto dia e noite
O meu amor por ti
Às tardes tiro para o descanso
Cigarro prestes a estourar.

Musicada por Roque Braz

quinta-feira, 30 de abril de 2020

A FORÇA DA MATA E DO VENTO


Quando as bocas se abrem em ventania
E se muda o hálito do vento
Minhas mãos passeiam em teus cabelos
Untados de morte, novo unguento.

E se a roda gira e quer parar
O homem cansado de sofrer
Da madeira da mata que é virgem
Faz a clava possante do gritar.

Mas o néctar da flor se sente longe
Como gás que mata ou aleija
E a dor e o amor são seus irmãos.

Nos caminhos floridos e pedregosos
O zumbido do bicho no ouvido
Não desperta o caminho para o homem
Que finda sem ter chegado.

quinta-feira, 23 de abril de 2020

VELA


Claro
A vela acesa
A chama

A cera branca cera
Feito corpo
O corpo vai
Ao sabor do tempo
Como a chama
Ao sabor do vento

A vela acesa
Parece o homem novo
Rígido
E como o homem
A vela vai se consumindo

Na morte
Se acendem velas
Como que para anunciar
Nova vida
Eterna chama

Musicada por Roque Braz

quinta-feira, 16 de abril de 2020

BLUE AZUL


O blue ainda corre
No meu sangue
Intravenosamente
O álcool
A tesão
À noite
Só me falta teu corpo mágico
Para destruir essa dor
Que soa no meu peito
Como um vulcão
Prestes a ejacula
Tristezas.

quinta-feira, 9 de abril de 2020

PLATEIA


Minha única plateia
Já fechou a cara
Já fechou as janelas
Já cessou as palmas

Minha única plateia
Já dormiu
Pois a noite cansa
Feito trabalho braçal

Minha última plateia
Já está de saco cheio
Já abriu muito as pernas
E não quer mais rir
Nem pedir bis

Musicada por Roque Braz

quinta-feira, 2 de abril de 2020

FESTA PARA O MORTO


Onde estão todas as velas
Desta casa pra minh'alma?
Façam a festa,
O canto, a dança
Foi o corpo quem partiu.

Onde estão todas as rezas
Destas bocas bem tapadas?
Parem o coro, o choro
Soltem as paixões desenfreadas
Pois o morto ama a morte
Como o corpo a boa farra.

Musicada por Roque Braz

quinta-feira, 26 de março de 2020

PÃO E VINHO



Quero que me conheças
e quero me conhecer
como o sangue vermelho
e o destino
que correm nas veias
e nas estrelas.

Como a face da seda
molhada em duas vias
seu não grito
é porque não tenho voz
se não falo
é como já disse:
não tenho voz.

Mas parto meu corpo
em fatias de pão ou peixe
e choro vinho
para dar a você no banquete
de todo dia
que me comam e me bebam.

Musicada por Oswaldo Esteves
Gravada em 2002
CD "Maracatu pra ela"
https://www.youtube.com/watch?v=UOx7SvqgoV8

quinta-feira, 19 de março de 2020

quinta-feira, 12 de março de 2020

ABALROAMENTO


Abalroávamos brincando com carrinhos
De plásticos
Ou sentado em carrinhos de madeira:
Depois conferíamos nossos ferimentos:
Pequenos arranhões.
Barroávamos brincando de cabra-cega.
Uma vez, na escola pública,
Uma professora do Sul,
Que falava assobiando, disse:
“O certo é colisão”.
Não ligamos
E continuamos a nos abalroar
(abarroar)
E rir quando falávamos colisão.

quinta-feira, 5 de março de 2020

A ESTANTE

 


Guardava os meus livros na estante, com muito carinho. Amava-os. Mas, amava-os, mais ainda, as traças.

quinta-feira, 27 de fevereiro de 2020

A CHUVA

 

Chovia copiosamente. Havia deixado em casa seu guarda-chuva. Comprou alguns jornalistas, deu de troco um juiz e dois procuradores, e os fez de pano de chão.