quinta-feira, 22 de fevereiro de 2018

TOURADA



Sorridente e tensa,
arco ao lançar a flecha,
que nunca mais voltará;
touro a enfrentar
a morte na arena,
tenso,
corda de violão ao romper o som,
lanças do cruel toureiro.

quinta-feira, 15 de fevereiro de 2018

O GOZO E AS BORBOLETAS



De sua vagina,
quente, úmida e misteriosa,
quando me abria as pernas
paixões, medos e segredos mútuos:

saíam confissões, relaxos,
borboletas e orgasmos,
e um líquido branco sem cheiro,
que, entre risos, abraços e juras,
chamávamos tesão.

quinta-feira, 8 de fevereiro de 2018

A VELHICE



A pior coisa que existe,
num mundo criado por um deus guerreiro
e humanos sanguinários,
poderia ser a dor física, apenas,
a flecha penetrando a carne viva,
que sangra, uiva e grita.

A fome seria outra possibilidade,
pois é inexprimível o suplício do faminto;
do sedento: da sede de água, de justiça,
de igualdade, da sede do socialismo.

A pior dor que o deus guerreiro
dos cristãos legou ao mundo,
tinha que ser uma dor suprema,
indivisível, inimaginável, única, nunca sentida.
Por ser provocada pelo símbolo do amor,
da carência, da vaidade, das iniquidades,
uma dor que não consta dos livros sagrados
dos túmulos caiados, uma dor: A dor.

Qual ser, qual programa, qual matriz,
qual irrealidade
conspira para que nossos cérebros
sejam inimigos do nosso existir?

Nada, nada, nada, nenhum bálsamo,
nenhum médico, nenhum alquimista                 
nem feiticeiro,
descobrirá a essência da maldade
deste ser tão pusilânime.

A maior dor que um
pode cravar sobre outro ser,
Além de uma estaca no peito,
é a consciência do existir?
Sofro, logo existo;
desejo, logo sofro.

Nada é sonho,
nada é pesadelo
do qual possamos acordar
e sorrir: era tudo brincadeira!

Nada é mais vil e mais cômico,
mais devastador do que a velhice,
seus achaques, suas dores, o ridículo.
A velhice e a sua impossibilidade
de ser, de amar, de decidir
o que não lhe é, sadicamente, permitido.

quinta-feira, 1 de fevereiro de 2018

MINHA INFÂNCIA

 

Meus sonhos eram povoados
por lobos maus e padres
que comiam criancinhas,
mas minha mãe de criação, Lia,
contava estórias para eu, minino, dormir.
Coçava minhas costas e dizia:
dorme! Lobo mau não vem aqui!
Padre está rezando missa!

Minha avó Lídia penteava meus cabelos,
assim que, minino, saia do banho.
Mamãe me achava tão lindo, um rei.
Meu pai me sonhava
juiz ou médico, autoridade.
O mundo era enorme,
minha casa imensa,
a rua sem fim:
transbordavam-me os sonhos!